A Capital Europeia da Cultura e a crise


Por estes dias tem-se falado de Capital Europeia da Cultura. E eu não deixo de pensar que, em Dezembro, se vão contar quantas pessoas lá foram, quantas falaram, que eventos foram organizados, quantos estrangeiros lá estavam, qual a taxa de ocupação dos hotéis, quantas horas em directo, quantos metros de fio, qual a quantidade de luzes, holofotes, fogo de artificio, quantas fotografias se tiraram, quantas vezes se disse “Guimarães”, “capital” e “cultura” na mesma frase, entre outros. Porque nós somos mesmo assim. Dizem que a queda para a matemática é pouca, mas venham de lá os números, e quanto maiores, mais satisfeitos. Porque o português não perde um bom recorde, que se for do Guinness, tanto melhor.
De maneira que passo pelas ruas e vou pensando que um dia, lá para Dezembro, vão dizer ao mundo quantas pessoas ali passaram, quem era da cidade, quem era de fora, quem foi para ficar, quem nunca mais voltou; vai-se saber qual o número de visitantes, de carros, de apresentadores, de telejornais em directo. E tem graça saber quão grande somos, mesmo sendo pequeninos.

Com a crise é a mesma coisa. Não sei como ainda não se iniciou um movimento para saber quantas vezes por dia cada pessoa diz que está em crise, que já não suporta a crise, que nunca mais vamos ultrapassar a crise. Mais graça teria no entanto que todas as pessoas começassem antes a ver a crise com outros olhos, a mudar hábitos de vida, e ter mais força, a persistir mais.
Mas são assim as coisas ou o povo. É mais fácil ir desfiando a crise e contar recordes, do que olhar em frente com optimismo, determinação, força de vontade e garra. 
Em todo o caso e até que a frente cheque, “entretém-te, filho; havemos de pagar a puta da dívida*.”

* Remeto para 31 de Dezembro de 2011,
 com um pedido de desculpa aos mais sensíveis.

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