Na semana passada soube de uma campanha publicitária que foi posta no ar e de seguida retirada porque algumas pessoas se sentiram ofendidas.
A publicidade era de uma famosa marca de medicamentos para dores menstruais e dizia qualquer coisa como:
Sair de casa de fato de treino e encontrar a ex do seu namorado?
Há dores que só as mulheres conhecem!
Se pensar que há "coisas mesmo de gaja", revejo-me totalmente nesta publicidade. Não é verdade que se tivermos de nos cruzar com a ex do nosso homem, mais vale que o façamos no nosso melhor? Não é tão tipicamente de mulher este pensamento?
Pelos vistos várias mulheres levaram isto a mal. Tão a mal que a marca veio pedir desculpas e retirar do ar. Alegadamente, não fui confirmar.
Isto faz-me pensar no caminho em direcção à ditadura que estamos a fazer. Passamos de não poder pensar, para sermos livres, para agora não podermos falar outra vez, em nome de outra liberdade qualquer.
Fascinam-me em absoluto as pessoas - acho que já aqui falei disto. Fascinam-me sobretudo as pessoas cujo modo de funcionamento eu não compreendo; são um desafio ao meu cérebro, à minha capacidade de entendimento. Primeiro, neste caso, não percebo onde está a ofensa; segundo, não vejo como se invista tempo a energia em querer retirar isto do ar.
A verdade é que me tenho vindo a aperceber que nada do que se diga em público é bem recebido, mesmo os factos indubitáveis. Eu digo que os meus olhos têm uma parte branca e outra preta e de certeza que alguém virá dizer a seguir que sou racista porque me referi a olhos pretos e brancos (no meu caso ninguém virá dizer nada, graças a Deus pelo anonimato). Percebem a ideia? Somos biliões de pessoas que se prestam a milhões de entendimentos e o que me fascina é a tendência para a maldade em muitas interpretações. Porque é que uns olhos não podem ser só pretos ou brancos, sem segundas intenções? Porque é que uma marca não pode dizer que há coisas que só as mulheres percebem, sem segundos significados? E sobretudo, porque é que as pessoas não podem ser mais tolerantes com aqueles que dizem coisas contrárias às suas?
Tenho este princípio por verdade absoluta e muitas vezes na minha vida tenho decidido com base nele: a nossa liberdade acaba onde começa a dos outros. Que vale dizer, a liberdade dos outros também vai até onde começa a minha. E por isso os outros ( e eu) deverão poder ser livres para pensarem, falarem, opinarem como muito bem entenderem (não contendendo com a liberdade dos outros) sem que metade do mundo se enfureça só porque sim, se revolte só porque sim ou gere uma revolução só porque sim. Que não nos esqueçamos do tempo em que não éramos livres para pensar.