Só nós é que sabemos

No ano de mestrado tivemos uma cadeira que foi determinante. Depois de anos a sermos alunos, ali sentiamo-nos como pares. A alegria destas aulas devia-se essencialmente ao professor que tínhamos, que era brilhante, que desenvolveu em nós um espírito crítico a que não estávamos habituados. Passávamos as aulas a discutir, a debater, exactamente como o direito deve ser. Havia muita liberdade e éramos ouvidos, a contrastar um pouco com o que trazíamos da licenciatura. Um dia, na última aula, o professor de quem tanto gostávamos despediu-me até sempre com uma expressão de que lembro muitas vezes:

Só nós é que sabemos o que aqui se passou.

Há coisas que efectivamente não foram feitas para ser explicadas. Só vivenciadas. Talvez autores de excelência consigam explicar todas as coisas difíceis, consigam traduzir todos os sentimentos, todas as impressões, tudo o que se sente e se vive. Eu não consigo. Há uma grandeza e riqueza tão grande em algumas coisas e experiências, que só por quem elas passa consegue saber como foram.

Às vezes dizemos da nossa filha que "as pessoas nem fazem ideia como ela é", a querer dizer exactamente isso, que só quem vive com ela se consegue aperceber. É muito mais completa do que qualquer descrição e dizer-se que é bem disposta, sociável, que fala imenso e tem raciocínios fabulosos são apenas descrições vagas cheias de nada. 

Nunca me pus a imaginar que género de pais seriamos quando tivéssemos um filho ou que família seria a nossa mas se tivesse desejado alguma coisa seria de certeza assim. Formamos um pack de três e isto é uma coisa que só nós sabemos.

 

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