15 agosto, 2022

Pós-parto

 Engravidei três vezes na minha vida.

Na primeira engordei 9 quilos. Na segunda 11. Em ambas, vestia toda a minha roupa pré-gravidez, no fim de quinze dias depois de nascerem. Não tive barriga de pós parto e recuperei todo o peso anterior. Tinha 27 anos na primeira, 30 na segunda.

Depois engravidei a terceira vez, com 35 anos.

Já aqui falei várias vezes do meu peso quando era uma criança. Ainda que não se falasse em obesidade infantil, pelo menos não como agora, eu era uma criança obesa. Com 10 anos pesava quase tanto como quando estava grávida de oito meses. Lidava perfeitamente bem com isso, na verdade nem me achava gorda (aquela inocência da infância) mas mudei de escola, de cidade, de amigos e os colegas novos fizeram questão de me fazer perceber o quão obesa era, o quão horrível e medonho era o meu corpo, quão nojentas eram as banhas da minha barriga. Com todas as letras. Perdi imenso peso depois disso mas perdi também toda a confiança. Afinal, eu não era tão maravilhosa quanto me achava aos dez anos; era só um saco de gordura, com uma banha boia que não me salvava de me afogar na censura. Dos outros primeiro, minha depois. Perdi mais de vinte quilos e entrei num peso "normal." Depois disso, já adulta, fui engordando e emagrecendo ao som de coisas várias mas há muitos anos que, tirando as gravidezes, o meu peso estava totalmente controlado. 

Dos tempos em que era muito gorda e muito infeliz com isso, lembro-me de imensas coisas. Mas lembro-me de forma absolutamente clara do sofrimento de me vestir. Não só era difícil arranjar roupa - os tamanhos de criança não serviam e os de adulto, enfim, eram roupa de adulto; como era extremamente doloroso ter de me vestir no dia-a-dia e em especial em dias especiais. Tenho esta imagem gravada na memória a ferro, de tirar tudo do armário, vestir todas as roupas, odiar imensamente tudo, atirar tudo para cima da cama e no fim, vestida com o menos mau, voltar a arrumar tudo outra vez. Detestava ver-me ao espelho, detestava vestir-me, detestava aquela dança do escolhe-veste-fica mal-despe-escolhe-veste-fica mal-troca. Cada roupa que vestia era mais uma assinatura na declaração do meu excesso de peso mas, mais do que isso, do meu mau aspeto. Há muitos anos que não me sentia assim. Casei no meu mais baixo peso de sempre e daí variei três ou quatro quilos mas nunca mais saí de um número razoavelmente aceitável, que dava pelo menos para vestir tudo o que queria e não ter de trocar de roupa depois de a escolher do armário porque ficava pessimamente mal.

Depois engravidei a terceira vez.

Adoro a minha filha e a gravidez não é de todo a questão. Mas engordei 17 quilos. 17. Até me custa pensar neste número. É verdade que estava enorme mas, caramba, 17? Só me apercebi disso no dia do parto, na pesagem para a epidural. Dezassete quilos...

Quando cheguei a casa do hospital, com a bebé no ovo, as minhas filhas perguntaram-me se ainda tinha o bebé na barriga. Os meninos da escola delas continuaram a perguntar-me se eu ainda tinha o bebé na barriga um mês depois dela nascer. Perdi 7 dos 17 quilos mas tenho 10 a mais. E a barriga é de pelo menos 5 meses de gravidez, sem que lá dentro esteja qualquer bebé. Desconheço completamente este corpo, não me identifico, não sou eu, não sei quem é. A minha roupa não me serve, as calças não apertam, os vestidos ficam apertados, a roupa de praia - que é larga e solta - fica uma tenda, uma mulher saco de batatas. Ou na verdade, só saco de batatas porque a parte mulher, evaporou. Voltei a ser a miúda que tem de se vestir, escolhe a roupa e volta à mesma dança veste-fica mal-troca, veste-fica mal-troca. A minha cama está cheia de roupa que não consigo vestir e que ao fim de dez tentativos, arrumo, já vestida com o que ficou menos mal. Estou enorme, a minha barriga está enorme, parece uma alforreca presa ao corpo, que não descola, não sai. Não consigo vestir biquinis e não tenho um fato de banho que me sirva. Estamos em pleno verão. Mesmo que não queira estou exposta quando a minha vontade era enrolar-me na toalha e ficar a hibernar com o corpo todo tapado.

Claro que agora vem a segunda parte. E porque é que não fazes nada em relação a isso?

Não tenho energia. Há anos que não fazia nada para manutenção do peso, era como era. A minha rotina não incluía comida ao almoço (porque me sabia melhor um pão, um iogurte, fruta, etc.) e era o bastante para manter, mesmo com uns doces pelo meio. Era controlado. Agora está descontrolado mas sinto fome 24 horas por dia porque amamento 24 horas por dia e estou sempre com apetite. Nem se quer quero não comer comida porque me compromete o leite e eu estou focada nisto. Não consigo ver como vou perder os dez quilos a mais, nem tão pouco a barriga alforreca. Mas além de serem ambos terríveis, fazem-me um mal imenso, fazem-me outra vez ser todos os dias a obesa dos dez anos a quem todos gritavam "gorda!, gorda!, gorda!" E o pior é que eles têm razão.

1 comentário:

  1. É a vida.
    Nenhuma beldade envelhece mantendo a sua silhueta da juventude.
    As que tentam, precisam de muita cirurgia estética!

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